Vínculo foi reconhecido pela terceira turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Se o vínculo for reconhecido de forma definitiva, empresas teriam de arcar com direitos previstos na CLT
São Paulo – A terceira turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) formou maioria nesta quarta-feira (15) para reconhecer vínculo empregatício entre a Uber e seus motoristas.
Uber e motoristas têm vínculo empregatício reconhecido pelo TST (Foto: Divulgação/Unsplash)
O julgamento foi retomado nesta quarta-feira (15), na turma, com voto do ministro Alberto Luiz Bresciani, que acompanhou o ministro Maurício Godinho Delgado, relator, que havia votado em dezembro de 2020. O outro ministro da turma, Alexandre de Souza Agra Belmonte, pediu vista do processo (mais tempo para análise) e travou o julgamento.
Esta é a primeira turma do TST que se posiciona a favor dos motoristas em processos que analisam vínculo empregatício com a Uber. Outras duas turmas, quarta e quinta, já haviam julgado processos sobre o tema, mas sempre com maioria a favor da empresa. Como o tema é divergente em diversas turmas do TST, seções superiores do tribunal terão de uniformizá-lo.
Os motoristas hoje são considerados trabalhadores autônomos. Se o vínculo for reconhecido de forma definitiva, as empresas teriam de arcar com os direitos previstos na CLT, como férias, 13º, FGTS e outros.
O ministro Alberto Luiz Bresciani, que apresentou seu voto na tarde desta quarta, citou o posicionamento de outros países, principalmente europeus, que já reconheceram vínculo empregatício entre motoristas e empresas de aplicativos.
No início de novembro, o Ministério Público do Trabalho informou que ingressou com mais de 625 ações em todo o país na tentativa de reconhecer vínculo entre empresas de aplicativo de transporte e seus trabalhadores.
As empresas de aplicativo, por sua vez, defendem que não existe vínculo entre o trabalho prestado e, eventual reconhecimento, poderia impactar seus modelos de negócio, já que o custo seria maior.
Procurada, a Uber afirmou em comunicado que os votos dos ministros Mauricio Godinho e Alberto Bresciani, da 3ª Turma do TST, se basearam em “concepções ideológicas” sobre o funcionamento do Uber e da atividade dos motoristas no Brasil. A decisão dos ministros, para a empresa, representam “entendimento isolado e contrário ao de todos os cinco processos julgados no próprio Tribunal – o mais recente deles no mês passado”.
A companhia de transporte por aplicativo defende que os motoristas não são empregados e nem prestam serviço à Uber.
“Os motoristas escolhem livremente os dias e horários de uso do aplicativo, se aceitam ou não viagens e, mesmo depois disso, ainda existe a possibilidade de cancelamento”, argumenta a Uber. “Não existem metas a serem cumpridas, não se exige número mínimo de viagens, não existe chefe para supervisionar o serviço, não há obrigação de exclusividade na contratação da empresa e não existe determinação de cumprimento de jornada mínima.”
“A Uber irá aguardar o voto do ministro Alexandre Belmonte para se manifestar sobre a decisão, mas no momento cabe esclarecer que os votos proferidos pelos ministros Mauricio Godinho e Alberto Bresciani, da 3ª Turma do TST, representam entendimento isolado e contrário ao de todos os cinco processos julgados no próprio Tribunal – o mais recente deles no mês passado.
Nos votos, aparentemente, as provas produzidas no processo foram desconsideradas e os ministros basearam as decisões exclusivamente em concepções ideológicas sobre o modelo de funcionamento da Uber e sobre a atividade exercida pelos motoristas parceiros no Brasil.
Os ministros fizeram exposição citando temas relacionados ao constitucionalismo humanista, a filmes cinematográficos sobre a digitalização da sociedade e à reestruturação do sistema capitalista, porém pouco espaço foi dedicado às provas concretas do processo, como o fato do próprio motorista ter reconhecido, em depoimento à Justiça, que não recebeu nenhum tipo de ordem, nem teve nenhum tipo de supervisão, nos 57 dias em que usou o aplicativo da Uber até ser descadastrado por violação aos Termos de Uso da plataforma – aos quais todos aderem no momento do cadastro.
Essas provas foram analisadas pelo Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro, que, fundamentado nelas, negou a existência de vínculo de emprego do motorista com a Uber tanto na primeira como na segunda instância, considerando que ele “possuía plena autonomia para definir os dias e horários de trabalho e descanso” e que “não recebia ordens nem precisava prestar relatórios de seu trabalho”.
Em sua exposição, os ministros também citaram decisões judiciais de outros países – algumas das quais já foram inclusive revogadas – na contramão do entendimento do próprio TST de que decisões estrangeiras não devem influenciar o Judiciário brasileiro por serem criadas em “ordens jurídicas absolutamente distintas”.
Jurisprudência
Nos últimos anos, as diversas instâncias da Justiça brasileira formaram jurisprudência consistente sobre a relação entre a Uber e os parceiros, apontando a ausência dos quatro requisitos legais para existência de vínculo empregatício (onerosidade, habitualidade, pessoalidade e subordinação). Em todo o país, já são mais de 1.650 decisões de Tribunais Regionais e Varas do Trabalho reconhecendo não haver relação de emprego com a plataforma.
Os motoristas parceiros não são empregados e nem prestam serviço à Uber: eles são profissionais independentes que contratam a tecnologia de intermediação digital oferecida pela empresa por meio do aplicativo. Os motoristas escolhem livremente os dias e horários de uso do aplicativo, se aceitam ou não viagens e, mesmo depois disso, ainda existe a possibilidade de cancelamento. Não existem metas a serem cumpridas, não se exige número mínimo de viagens, não existe chefe para supervisionar o serviço, não há obrigação de exclusividade na contratação da empresa e não existe determinação de cumprimento de jornada mínima.
O próprio TST já afastou em cinco julgamentos a existência de vínculo de emprego entre a Uber e os parceiros. Em maio, a 5ª Turma afastou a hipótese de subordinação de um motorista com a empresa uma vez que ele podia “ligar e desligar o aplicativo na hora que bem quisesse” e “se colocar à disposição, ao mesmo tempo, para quantos aplicativos de viagem desejasse”.
Em março, a 4ª Turma decidiu de forma unânime que o uso do aplicativo não configura vínculo pois existe “autonomia ampla” do parceiro para escolher “dia, horário e forma de trabalhar, podendo desligar o aplicativo a qualquer momento e pelo tempo que entender necessário, sem nenhuma vinculação a metas determinadas pela Uber”.
Entendimento semelhante já foi adotado em outros dois julgamentos do TST em 2020, em fevereiro e em setembro. Também o STJ (Superior Tribunal de Justiça), desde 2019, vem decidindo que os motoristas “não mantêm relação hierárquica com a empresa porque seus serviços são prestados de forma eventual, sem horários pré-estabelecidos, e não recebem salário fixo, o que descaracteriza o vínculo empregatício” – a decisão mais recente neste sentido foi publicada em setembro.”
Fonte: Governo do Estado do Amazonas em 12/12/2021
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