Por uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE ), o envio em massa de mensagens com informações falsas nas eleições de 2022 será considerado abuso de poder econômico – motivo que leva a cassação imediata do político que se envolver com a prática.
As chamadas fake news, que dominaram as redes na eleição de 2018, entram na mira da mais alta corte da Justiça Eleitoral. No entanto, os desafios ainda são colossais e o Tribunal se prepara para enfrentar o desafio que é garantir a lisura das eleições. Especialistas ouvidos pelo R7 apontam a necessidade de investir em tecnologia para identificar infratores e destacam que ninguém está imune a ser encontrado pelas autoridades.
Apesar de existirem camadas mais profundas da internet, que não se pode acessar por meio de navegadores comuns, todo passo dado no ambiente virtual deixa um dado. A Polícia Federal e outras instituições públicas possuem ferramentas que podem refazer os caminhos de um criminoso que usa o meio cibernético como palco para realizar ataques e irregularidades. A produção de fake news não foge a essa regra. A edição de fotos, vídeos, áudios e até mesmo a criação de textos e páginas deixam pegadas que podem ser identificadas para chegar fisicamente até o criminoso.
No processo que analisou para tratar de disparos em massa nas eleições de 2018, o TSE entendeu que ficou evidente que a prática ilegal ocorreu. No entanto, os ministros entenderam que os autores das ações que apontaram irregularidades falharam ao não anexar eventuais mensagens em massa que foram disparadas. Ou seja, se denunciou a estrutura e o modus operandi dos disparos em massa, mas não se colocou nos autos o resultado prático, que poderia gerar fraude e abuso de poder econômico.
Dionísio Silva, consultor da TFI Brasil para Tecnologia da Informação e Comunicação e Big Data, destaca que a tarefa de encontrar criminosos especializados na prática de fake news, embora seja uma tarefa que exija esforços humanos e tecnológicos, é plenamente possível. “Hoje há softwares capazes de averiguar adulterações em imagens, vídeos e áudios que tenham sido modificados por intermédio de códigos que façam parte da originalidade daqueles arquivos. Como todos esses arquivos têm uma espécie de DNA, os softwares conseguem perceber distorções na imagem, alteração na frequência do áudio e distorções nos vídeos, desvendando os elementos falsos ou conflitantes encontrados em cada um deles”, diz.
O especialista destaca que os rastros são deixados não só por quem cria o conteúdo fraudulento, mas também por quem compartilha – provas que podem atingir candidatos, equipes de campanha e integrantes de partidos – e resultar na cassação dos eventuais eleitos com base em fake news. “É possível localizar o ip do computador ou qualquer dispositivo que envia mensagem, inclusive de quem publicou e de quem possivelmente compartilhou. Essa tecnologia pode chegar a mostrar quantas vezes foram compartilhadas e cada uma das pessoas que distribuiu a fake news”, explica Dionísio.
Ao longo dos últimos anos, com a evolução das tecnologias usadas para reconhecer rostos, captar dados para publicidades, pesquisas e evolução do algoritmo – sequência lógica que se baseia no comportamento do usuário para oferecer conteúdo – as práticas criminosas também se tornaram mais sofisticadas. Um dos riscos é de que edições quase fieis a imagem real de políticos, personalidades e até anônimos, junto com alterações de som para reproduzir a voz das pessoas sejam usadas para confundir a cabeça dos eleitores e imputar declarações contra quem nunca as fez.
A prática é conhecida como deepfake utiliza inteligência artificial para criar vídeos falsos de pessoas reais. Ao mesmo tempo que os criminosos, conhecidos como crackers, elevam sua gama de ferramentas, os especialistas, corporações policiais e organizações investigativas também avançam neste campo. Uma ferramenta criada pela Universidade de Samara identifica distorções nas imagens para indicar edições. O programa está sendo usado para avaliar, por exemplo, fotos de lançamentos de mísseis pela Coreia do Norte, a fim de avaliar a veracidade dos registros e apontar qual a real capacidade de ataque do país oriental.
O Facebook apresentou um projeto focado na desarticulação de deep fakes. O algoritmo encontra falhas e assinaturas além da imagem original que apontam as fraudes. “Para desenvolver o sistema, eles usaram a técnica conhecida como engenharia reversa, que consiste em desconstruir a fabricação de um produto, neste caso, um vídeo ou uma foto”, explica Dionísio Silva. Existem modelos que estão há mais tempo no mercado. Um deles é o Video Authenticator, lançado pela Microsoft para detectar deep fakes em vídeos.
De acordo com a empresa, a ferramenta foi lançada pelo Programa de Defesa da Democracia, que tem como objetivo combater a desinformação que ameaça regimes democráticos em todo o mundo. O lançamento ocorreu antes da eleição nos Estados Unidos.
O especialista em segurança pública Leonardo Sant’Anna afirma que é fundamental investir em contingentes de analistas forenses e campanhas de conscientização para combater a difusão de conteúdo falso nas eleições. “É possível (combater) desde que faça um força-tarefa com profissionais para esse trabalho. Figuras com a de Analistas Forenses Digitais, por exemplo, passam a ter um papel fundamental. Por outro lado, também é importante que haja um trabalho intenso visando a conscientização e a participação da comunidade visando a denuncia das fake news”, afirma.
Além da internet comum, onde estão a maior gama de informações e dados, a rede mundial de computadores tem outras camadas, mais profundas, com acesso mais restrito onde são planejados ataques, transmitidas informações, comércio e acaba se tornado espaço para a venda de pacotes de disparos em massa e produção de notícias falsas. A deep web e a dark web são acessadas apenas via link e muitas páginas, apenas por meio de convites específicos.
No entanto, apesar de prometer proteção contra as autoridades, assim como nos demais ambientes, a deep e a dark web também deixam um rastro de navegação. Os navegadores utilizados pelos usuários mascaram e trocam os endereços codificados dos computadores (IPs) e até trocam constantemente esses dados para impedir a localização. No entanto, a Polícia Federal e outros órgãos também navegam por esses espaços e ferramentas de engenharia reversa podem refazer o caminho de quem cria conteúdo nestes locais virtuais.
As empresas que gerenciam aplicativos de mensagens e redes sociais tem importância direta e são responsáveis pelas políticas de combate às fake news. No entanto, a advogada Jessica Marques, especialista em direito digital, destaca que algumas vezes, as regras das empresas dificultam o trabalho de investigação.
“As fake news geram consequências gravíssimas, tanto na esfera pessoal, quanto na esfera pública. Quem compartilha, cria, pode ser responsabilizado pelo crime. Temos várias delegacias especializadas, que através de perícia podem identificar alterações e chegar até os autores… Nós temos aplicativos, que em razão da proteção de dados, dificulta a localização dos autores. A privacidade deve ser protegida, mas ela não abarca atos criminosos”, diz.
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